Uma história verídica...
Anteontem à noite aconteceu-me um episódio caricato.
Enquanto aguardava, no Campo Grande, pela abertura das portas do meu autocarro das 22:30, reparei que a rapariga que se encontrava ao meu lado dizia para um terceiro elemento, um homem nos seus 40 e poucos anos: "Lamento, mas não sei onde se apanha... talvez se perguntar a este senhor...". E apontou para mim.
Acerquei-me de ambos e pedi ao homem: "Diga, diga..."
O homem perguntou: "O autocarro para a Moita? Onde o apanho?"
Pensei um pouco e respondi: "Sinceramente, não sei. Mas olhe: pergunte ali ao motorista ou então no Metro, pode ser que eles saibam..."
O homem replicou de forma insólita: "Esta juventude... dizem que sabem mas não sabem coisa nenhuma!"
Eu e a rapariga entreolhámo-nos, arregalámos os olhos e sorrimos.
De novo, reforcei: "Pergunte ali ao homem. Pode ser que ele saiba..."
O homem saiu a barafustar qualquer coisa imperceptível e esteve cerca de 20 segundos à conversa com o motorista, que lhe abriu as portas por obséquio.
Regressando para junto de mim e da rapariga, tomei a iniciativa e perguntei: "Então?"
O homem, muito simpaticamente, ripostou: "Diz que sabe tanto como eu! Tsss!", enquanto abanava a cabeça e olhava com ar condenador para mim e para a moça.
Já com algum cinismo na voz, contra-argumentei: "Bom, então não lhe resta outra alternativa senão procurar por si! Alguma destas placas há-de dizer "Moita" como destino..."
O homem, com o dom da compreensão e mel na voz, declamou: "Era só o que faltava! Agora vou andar aí a bater com a cabeça nas placas, não? Ninguém aqui sabe nada! Já sou português há mais de 40 anos e agora tenho de andar aqui a ver o nome das coisas, não?"
Fiquei com a ligeira sensação de que o homem estava a mandar vir, mas não tenho bem a certeza do quê.
Tinha, no entanto, a certeza de que na altura pensava: "Oh, oh, tá parvo..."
As últimas palavras que trocámos saíram da minha boca: "Olhe, faça pela vida! Mexa-se!". E entrei no autocarro.
O maior espanto no meio disto tudo é que o homem não se encontrava sob o efeito de álcool.
Estava sóbrio e, por qualquer razão que desconheço, muito, muito zangado.
Ontem relatei este incidente à minha namorada e ela ficou algo chateada.
Nada de mais, para ser sincero.
Primeiro ela gritou: "O QUÊ?!?", enquanto virava a mesa de esplanada onde nos encontrávamos.
Depois, e enquanto me cacetava com o corpo inanimado de um infeliz transeunte que por ali circulava, berrou: "NÃO TENS VERGONHA? NEM UM PINGO DE VERGONHA? COMO PUDESTE DEIXAR AQUELA POBRE ALMA ALI, AO FRIO, SEM SABER ONDE APANHAR O AUTOCARRO PARA A MOITA? ÉS UM MONSTRO! NÃO TENS CORAÇÃO! ODEIO-TE! ODEIO-TE!!!"
E neste momento, neste exacto momento em que a enfermeira encarregue da minha cama me limpa as beiças depois de ter comido a sopa por uma palhinha, penso: se calhar o meu amor tem razão, e eu não tomei a melhor atitude...
1 Comentários:
o homem não queria andar aí a bater com a cabeça nas placas, pois não? querias ser tu ? lol ou se calhar fazias a pergunta por ele aos outros lolol
ha portugueses que ao fim de 40 anos ainda não sabem onde/como se vai para a moita :(
e triste!
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