Roderico, último da sua linhagem de influência
Nunca pensei ser possível. Nunca imaginei que tal dia ou conjuntura se proporcionassem. Nem mesmo no meu mais obscuro pesadelo sonhei com esta vicissitude.
Mas a verdade é que aqui estou. Suo e arfo e não quero acreditar no que me rodeia. Milhares de almas desgarradas e despreparadas, separadas em dois lados prontos para se matarem apenas para mostrar qual o ódio mais forte. Sente-se o cheiro a morticínio. Tenho dificuldade em respirar por entre o pânico de permeio no ar denso e bafiento e quase palpável. Rufam os tambores de guerra. Sinto-os pulsar, embora não os escute. A urdidura prepara-se. O nublar torvo clausura a fobia. O tempo perde o sentido.
E então acontece. Entre assombro e sentimentos de opressão turvos, tudo me parece estar a acontecer demasiado depressa. As duas muralhas humanas colidem com uma força atroadora. O entrechocar das armas e dos escudos e das armaduras e da carne faz-me recuar, mas apenas na minha mente. Estou paralisado. Colado ao chão, enquanto gritos de raiva e de dor que só agora ouço me enchem a cabeça numa voragem que não me deixa pensar. Estou a enlouquecer. À minha volta a confusão e o horror são demasiados, enquanto ferro penetra em carne e indivíduos são estraçalhados, causando sofrimento em volume tal que para onde quer que se olhe e atente paira a sombra da Morte. Tenho medo. Pavor. Estou em pânico. Não quero morrer. Perdido insanamente neste ciclo, nem dou conta do cerco que sobre mim se aperta. Mal me apercebo sequer da clava que voa na minha direcção, empunhada por braço humano e impulsionada por rancor sem razão. O meu instinto de sobrevivência é mais forte do que eu e, sem saber como, enrista-me o braço e bloqueia o golpe. Ouço a minha voz num grito de angústia, enquanto a minha espada me voa da mão e o meu braço se parte sem que dê conta, a não ser quando estou a cair. As lágrimas toldam-me a vista, enquanto o céu desfila à minha frente. Não quero morrer. A dor emerge do meu cérebro e eu grito como nunca antes gritei. Deus, eu não quero morrer. Não quero morrer, mas vou morrer, pois a lâmina da minha própria espada é crivada na minha goela, pregando-me ao solo, enquanto a clava fatal trespassa os limites da demência e estropia a minha face, cortando o meu último suspiro e não me deixando sequer morrer afogado no meu próprio sangue. A visão. A minha visão. A minha última visão. Deus, não. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
1 Comentários:
Olha, eu pensei - pronto, se tem de ser tem de ser. Mas depois não foi.
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