Conta-me uma estória: Capítulo I
Num minuto, está-se ao espelho a ajeitar o raio do colar cervical que teima em se desajustar.
No outro, estranha-se a bizarria de se estar a levar com uma leviana brisa na face, e de se ter o fofo tapete do chapéu de um sobrenatural e gigantesco cogumelo debaixo dos pés.
Num minuto, está-se a proceder à preparação de uma inversão cromossómica de glândulas salivares de larvas.
No outro, tem-se de frente, olho nos olhos, um copioso globo ocular fixo e intrigado na nossa pessoa, globo ocular esse que, assim que se afasta e permite vislumbrar a quem ele pertence, desdobra à nossa vista a irreal visão de um enorme varano apoiado sobre as duas patas traseiras.
Um varano que sorri para nós.
Num minuto, está-se a entrar numa sala de aula, ou a coçá-los numa Repartição de Finanças, ou a implementar um web service, ou a trabalhar arduamente no Museu de Ciência, ou a dizer ao chefe que a culpa não é dele, ou a puxar o autoclismo, ou a preparar o lanche, ou a jogar à bola, ou a tomar um café com o melhor amigo.
No outro, está-se arrebatado pela prodigiosa envergadura da gigantesca ave que sobre nós augura, uma espécie de aparição saída de um qualquer conto fantástico.
Um gaio, desmesurado, de largos metros de altura, de penas pintalgadas de cores que nem sequer se julgavam existir, e que parecem de cores totalmente diferentes a cada vez que se olha.
Tudo mudou num minuto.
E a casualidade banal de quem está habituado à real realidade deu lugar ao choque.
Onze individualidades perdidas num imenso jardim que, até agora, só existia na crendice do imaginário.
Um jardim com plantas exóticas, algumas delas ofendidas por estarem a ser espezinhadas por estes abjectos estrangeiros.
Com animais pródigos em excentricidade, pelo menos olhando para os dois que perante eles se manifestavam.
Os dois visíveis no momento.
Onze individualidades perdidas.
E sem qualquer consciência tomada sobre o que os cercava.
O Pete foi o primeiro a conseguir sair da catatonia, apenas para dar por si a olhar para trás em resposta ao som de passos em terra batida.
"Ah, óptimo, já chegaram," disse o ancião sobrevindo por detrás do grupo.
"Ora deixa cá ver: um, dois, três... dez, onze. Humpf. Falta o outro. Atrasado, como é seu apanágio."
O velhote, apesar das suas gastas e andrajosas vestes e de uma débil forma de se deslocar, punha os sentidos em alerta pela forma como mirava, com aguda e penetrante argúcia, cada um dos aparentes intrusos à sua moradia.
Um sorriso formou-se no rosto do velho.
"Mas que grupo mais esfarrapado que vocês me saíram. E cada um único à sua maneira. E isso é que é preciso. Bom, vá, venham lá. Entrem," pediu o velho, enquanto estendia uma mão em direcção àquilo que, supostamente, seria a sua choupana.
Todos olharam para a casa.
E a casa olhou de volta.
Queixos caíam e olhos esbugalhavam enquanto a criatura-casebre, uma espécie de cruzamento entre polvo e casa de colmo, desenleava os tentáculos por cima da porta e abria passagem para o seu interior.
Espera.
Aquilo não é a porta.
É a boca do bicho.
Ninguém se moveu dos seus sítios, tal era o arroubo anímico.
Ninguém a não ser a Anna que, com um passo em falso, deu por si a falhar os limites do chapéu do cogumelo onde se encontrava e a estatelar-se de cara no castanho dos torrões três metros abaixo.
A acalmia no semblante do velho deu lugar a uma terna impaciência. "Uf. Isto vai ser mais demorado do que eu esperava. Vocês ainda vão precisar de entranhar muita coisa. A começar pela vossa aparência."
Esta última sentença fez soar os alarmes da incompreensão em cada um dos elementos do grupo, que ainda nem sequer tinham tomado o tempo para perceberem quem exactamente é que os rodeava.
"AAAAAAAAAAHHH!," berrou o R2-D2 em aguçada voz, enquanto olhava horrorizado para o Pete.
"AAAAAAAAAAHHH!," gritou a Player1331 na direcção do Pato, e imediatamente antes de cair para o lado a ressonar.
"Aaaaaaaaaahhh?," exclamou interrogativamente o ignoto vampiro, que se encontrava lado a lado com o varano do sorriso afável.
"Aaaaaaaaaahhh," assentiu a Cblues, enquanto colocava os óculos de sol.
"Dude, curto bué da tua série, mas eu é mais o Las Vegas," explanou a Mary com voz esgazeada.
"Demis Roussos?," indagou-se o Didelet, de atenção focada no R2-D2.
"Esse também entra no CSI?," respondeu de forma distraída a Mary.
"Olha, o velhote tem um anão de jardim," disse a Anna, após erguer o rosto da terra argilosa.
"Anão de jardim é quem te f#&eu a peida com uma verruma," invectivou espumante o Pwfh.
"Está fresquinho," proferiu o Tiagu.
"AAAAAAAAAAAAAAAHHHHH!," berraram quase todos em uníssono, quando fixaram o olhar no horror repulsivo da nudez do Tiagu.
"AAAAAAAAAAAAAAAHHHHH!," berraram quase todos em uníssono, quando fixaram o olhar nas próprias mãos.
"Decerto que o que está a acontecer deve ser deveras excitante, dado o volume dos bramidos dos que me rodeiam," declamou em voz asperamente grave o O Man que, enquanto espelho, se limitava a estar assente no solo e virado para o céu.
De braços tombados e de audível suspiro, o velhote virou costas e começou a estugar passo em direcção à choça cefalópode.
"Bom, levem o vosso tempo. Já percebi que ainda estão "lá", e não "cá". Depois entrem. Eu explico tudo. Ah, e tragam aí o rapazinho, que ele não tem pernas para andar," disse o velho, apontando uma mão renitente na direcção do O Man.
"Alguém quer chá? Vou fazer chá."
O Narrador indaga:
O que é que cada um de vós deseja fazer perante o cenário que se vos apresenta?
Submetam a vossa decisão por comentário ou, caso não pretendam dar a conhecer a vossa intenção a terceiros, submetam por email.
São livres de optar por não fazer nada.
Para efeitos de intrigas e conspirações, submetam um email para contameumaestoria@gmail.com.
10 Comentários:
o pete adora chá, como tal, entra na casa do velho. quase de certeza que, durante o chá lê proust, porque nunca se bebe chá sem se ler uma boa folha.
beber chá e ler proust ou outro intelectual é tudo o que peço.
isso e nunca me enfiar na cama com o grilu. mas imagino que a paula bobone achasse má educação um zombie libertino.
o resto, deixo nas mão dos outros, dos que me quiserem criar intrigas maléficas.
Hahahahahaha, muito bom!
Acho que funciona melhor, se quem tiver sugestões as apresente por email, para que o efeito surpresa apure os contornos da estória. Abraço a todos.
Bom trabalho Grassa!
Aaaaaaaaaaaaaaaah !!!
Eu seguirei a sugestão de PWFH e vou enviar os meus desejos por e-mail. Ganha-se em factor surpresa e é sempre confortável ter o Grassa como bode "respiratório"
Já enviei o curriculum :D
E vem com foto :D?
e para quando o capitulo II?
eu sou uma leitora compulsiva, tenho necessidades.
:P
Ainda faltam respostas de alguns participantes.
Tentarei que seja ainda antes do final da semana...
A minha já lá está. Mas oh pá, é preciso que descrevas melhor o pessoal, para que fique claro que sou a Bobonne toda nua. Senão vai parecer irreal considerar-se a minha nudez um horror, e quem me conhece vai perceber que isto é tudo inventado...
É preciso as pessoas terem as descrições das personagens cientes em mente quando lêem cada capítulo.
No entanto, frisarei mais a tua asquerosa falta de roupagem...
À tua responsabilidade, no entanto.
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